quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Tristeza dupla

Mais um crime envolvendo extrema crueldade. Ao longo de uma semana, o Jornal “O Globo” publicou série de reportagens sobre o drama da população de periferia (favela e arredores) que vive sob à ditadura do tráfico. E, logo após, noticiou o seqüestro de um dos entrevistados, um líder comunitário cujo corpo foi encontrado, dias depois, esquartejado e carbonizado.

As suspeitas recaem sobre milicianos (milícias compostas por policiais) que haviam sido denunciados pelo líder morto por extorsão.

Há alguns meses escrevi, aqui, um desabafo (“Crueldade inata?”) para dizer que me recuso a aceitar a teoria dos que querem "condenar" seres humanos indefesos que crescem nas ruas, como vira-latas, sem acesso à educação. Afinal, se qualquer plantinha precisa de um mínimo trato para crescer saudável, o que dizer das crianças... É irracional esperar que o futuro, por si só, venha engendrar “gente boa” a partir dessa semeadura que se faz: desamparo, desamparo e desamparo. Não seria justo que a sociedade que desamparou e, portanto, forjou o delinqüente, simplesmente opte por “despachá-lo”.

É nesse meio, sob esse terror e crueldade, que as crianças da periferia do Rio de Janeiro estão crescendo: assistindo esquartejamento, que é a pena praticada nesse “estado paralelo”. Eu me lembro de uma matéria que li, há alguns anos, em que uma testemunha do caso Fernandinho Beira mar, narrou essa prática contra um jovem que se atrevera a namorar uma das mulheres do traficante: os restos do corpo foram colocados em um carrinho de mão que foi conduzido pela favela a fim de exemplar e intimidar os habitantes da comunidade.

Leio esse noticiário e lembro-me da minha infância, quando as mulheres da família, muito sabiamente, afastavam as crianças sempre que iam matar alguma criação... Hoje, enquanto os filhos da classe média assistem as mortes de seres humanos na TV, os da periferia não só assistem na TV... Mas são expostos, perseguidos, maltratados, seja pelo tráfico, pelas milícias e pela própria polícia.

Enquanto isto, Renam é absolvido. Luto: pela morte do líder comunitário que sequer mereceu a proteção que lhe devia o Estado, após a denúncia que fez. Luto: pela morte do Senado Federal.

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